Excerto da Resenha Crítica da Obra “Currículo e Competência” de Philippe Jonnaert, Moussadak Ettayebi e Rosette Defise, publicada pela editora Artimed-Porto Alegre, em 2010
Pensar Currículo é controverso. É como o amor – todo mundo ama. Mas, quando chega a hora de nos inquirirmos à respeito de tal sentimento; o mundo não sabe teorizá-lo. Mas é da teorização dos conceitos que surgem os planos de ação pedagógicos.
Um velho adágio popular, não muito distante daquele que Trotsky empreendera; apela-nos a reconhecer-se no outro, “queres conhecer a própria casa, vá antes à casa do outro”. Eis a artimanha do destino.
A Universidade pretendeu fazer-me conhecer o sistema de ensino angolano mediante o estudo analítico,… crítico,… cínico,… dos sistemas de ensino brasileiro e português, respetivamente. Julgou, assim, que o coração da lusofonia me instruísse a respeito da minha própria realidade académica. Porém o destino foi oportuno – fez-me vivenciar, pelo menos em parte, o sistema de ensino anglófono. Este confronto metodológico entre currículo lusófono e currículo anglófono, só pôde parir uma síntese: o sistema de ensino angolano é uma completa desilusão para a anglofonia, e uma dolorosa vergonha para a lusofonia. Primeiro, porque esse sistema de ensino permite o monopólio das tomadas de decisão em matéria de educação, colocando os atores envolvidos no processo, à margem de assuntos de seu interesse, e a seguir por não haver pretensão, por parte dos atores de nível macro da política de educação de melhorar o panorama académico atual.
Essas conclusões não me merecem senão repugnância, e um crescente desejo – (…) vontade, (…) de potência.
Longe de ensaiar uma perspectiva curricular própria, que se adéque aos anseios do angolano em matéria de educação, o presente texto não é senão uma mera recensão crítica da obra Currículo e Competências de Philippe Jonnaert, Moussadak Ettayebi e Rosette Defise. Esse texto sim, sugere uma nova abordagem curricular, aquela que valoriza a Interação no processo de ensino-aprendizagem.
Inicialmente a preocupação dos educadores estava em garantir o acesso à educação e quantificar os indicadores de desempenho para o sistema escolar. Nos dias de hoje portanto, a principal questão está na qualificação tanto do corpo docente quanto do currículo, principalmente no que se refere a qualidade das formações.
Assim, para viabilizar a medicação dessas enfermidades curriculares, os especialistas estruturam essa obra cirúrgica, por assim dizer, em duas partes, a primeira parte trata do conceito de currículo, sugere uma definição e aponta certas características bem como suas funções. A segunda parte analisa o campo semântico da noção de competência.
O turbilhão de escolas privadas, público-privadas e privatizadas que asfixia o panorama académico angolano, só denuncia o enfraquecimento, não a fraqueza da escola pública. Porém esse enfraquecimento não é deveras inexorável, se considerarmos que a força da escola privada reside na fraqueza da escola pública.
A causa da Escola da Ponte, em Portugal, é já uma afirmativa coerente de que é forçoso devolver a hegemonia da escola pública. Devemos abraçar a sua causa.
A luta da escola contemporânea passa necessariamente pelos velhos Golias da educação, porém delimita o espaço propício para a batalha final. Esta certeza gerou o caos, e do caos emerge inexoravelmente um novo modelo de homem – o Zarathustra, e dele depreenderá o próximo estágio da evolução humana. Não será o humanoide que empreenderá tamanha obra, não! O advento da era do conhecimento é obra de Zarathustra.
As conclusões das demandas por educação não podem desvincular-se da causa do materialismo dialético nem ignorar a especulação metafísica. Pois trata-se de identificar e instaurar novas formas de sobrevivência, das quais dependem a manutenção e preservação da espécie. Isso só será possível se as reformas educativas forem capazes de reformar, a partir da educação, toda esfera social, o que exige, primeiramente, a institucionalização de novos modelos interpretativos ou paradigmas, a partir dos quais podemos estabelecer um novo elo de relacionamento com a vida.
A obra resenhada é já uma proposta segura para se redefinir adequadamente, para o momento presente, os caminhos da educação, de modo que a vida escolar, sendo longa, possa ser feliz, atrativa e inclusiva.
Para tanto, os destinos da escola devem ser tarefa de toda a sociedade civil, e não circunscritos à uma minoria elitista, que fragmenta, deturpa e manipula o conhecimento, instrumento fundamental para a conquista do direito à cidadania.
Assim, o texto apresentado alcança a plenitude dos objectivos preconizados, embora grande parte de sua força motriz dependa da dinâmica do próprio leitor. Esta obra é especialmente dirigida à qualquer pessoa que se interesse por educação, seja professor, aluno ou consultor, quem quer que seja, encontrará nessa obra conhecimentos básicos para poder pensar educação.
Autor: Domingos Bengo, 2014
Editor: Cefal, 2019
Fonte (Texto Integral): Filosofia da Educação – Currículo e Competências, RC
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